A hora do almoço


Lívia Diamantino

Dez pras doze. Agora, nesse exato momento, você está reclamando com aquele seu dupla que não aguenta mais essa vida de agência, que está foda. Que chegou tarde do trabalho ontem e nem conseguiu descongelar o frango. Que nem teve força pra acordar pra academia. Que esse job está te enlouquecendo e só tem uma horinha pra engolir qualquer coisa. Qualquer coisa? É isso que eu sou pra você? Ah, para. Você bem sabe que não, né? Pelo menos, nos tempos de escola você me chamava de “minha farra de sexta”. Agora eu sou “qualquer coisa”. Mas nem vem que eu não vou perder meu tempo bancando o ofendido. Até porque tempo é o que não me falta. Sou exatamente o mesmo da sua adolescência e daqui a uns vinte anos, estarei impecavelmente igual. Nem um fungo a mais. Tudo bem que não sou como o vinho, não fico melhor com o tempo. Só igual mesmo. Mas também não sou tão pretencioso quanto sua atual farra de sexta. Eu sei o meu lugar. E sei que tenho um lugar cativo aí. Minha autoestima não se abala com você. Pelo contrário. Você é que não admite nem pra você mesma, vive inventando desculpa, mas o que quer mesmo é me comer. É isso mesmo. Você me deseja sim. É louca por mim sim. Não pode me ver que não resiste, sim senhora. Admita, porra. É mais rápido. Você é uma mulher sem tempo, lembra? Para de ficar aí rolando no Ifood procurando uma salada. Aí dentro, no seu coração, já está tocando “dois hamburgueres, alface, queijo, molho especial, cebola, picles no pão com gergelim”. Eu ouvi a vinheta daqui. Ah, não disse? Chegou. Já vi seu carro na fila do drive thru. Pera que eu tô indo pra bandeja. E hoje é com coca normal.

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Lívia Diamantino

E-mail: liviadgs@hotmail.com

  

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